A postura do deputado federal Julian Lemos, do PSL, em defesa da Paraíba ganhou repercussão nacional no debate sobre a distribuição das emendas. Uma matéria do Jornal O Globo, publicada nesta segunda-feira (26) mostra como o parlamentar se posicionou na frente de mais de uma dezena de funcionários e parlamentares da liderança do PSL para evitar o desprestígio da Paraíba na divisão do dinheiro das emendas do orçamento secreto entre os deputados do partido.
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Disputa por dinheiro do orçamento secreto causa inicio de rebelião no PSL
“O que vocês estão fazendo é roubo. Mas vocês não estão me roubando, estão roubando o meu estado! Não vou admitir!”, gritava o deputado federal da Paraíba Julian Lemos, na última quarta-feira (21), na frente de mais de uma dezena de funcionários e parlamentares da liderança do PSL.
O alvo de sua revolta era o líder da sigla, Major Vitor Hugo (GO), responsável pela divisão do dinheiro das emendas do orçamento secreto entre os deputados do partido.
Julian Lemos tinha acabado de saber que Vitor Hugo havia feito pedidos de liberação de emendas para um grupo de deputados do partido que não o incluía. E ele não era o único preterido.
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Na lista de WhatsApp do partido, já se ensaiava àquele momento uma pequena rebelião de parlamentares, à medida que iam descobrindo não terem sido contemplados na lista de emendas preparada pelo líder do PSL.
As emendas do orçamento secreto, que todo parlamentar disputa hoje nos bastidores, são diferentes das emendas regulares, a que todo deputado tem direito (neste ano, de R$ 16 milhões por parlamentar) e que ficam registradas nos sistemas de empenho da União.
Por essa modalidade de envio de recursos, o relator do Orçamento pode escolher para quem é para onde enviar o dinheiro sem ter que obedecer a uma cota fixa, nem explicar quais os critérios para o envio do recurso, nem dizer qual parlamentar é o dono daquela verba.
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Assim fica mais difícil fiscalizar se o dinheiro está sendo bem aplicado ou se houve toma lá dá cá em troca de votos, por exemplo.
O relator do Orçamento de 2021 é o senador Márcio Bittar (MDB-AC), mas segundo a sistemática estabelecida pela cúpula do Congresso, é Arthur Lira (PP-AL) quem comanda o dinheiro da Câmara.
Neste ano, Lira tem R$ 11 bilhões para distribuir entre os deputados. Outros R$ 5,8 bilhões vão para o Senado – e agora serão administrados por Ciro Nogueira (PP-PI) no ministério da Casa Civil.
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Na Câmara, como revelamos na semana passada, Lira criou um sistema de castas para a divisão do dinheiro das emendas, que varia de acordo com o tamanho do partido e também conforme a importância de cada parlamentar.
Deputados da casta inferior têm direito a carimbar cerca de R$ 20 milhões, líderes R$ 80 milhões e chefes de partidos e bancadas mais fiéis a Lira chegam a ter direito a distribuir mais de R$ 100 milhões em emendas para suas bases.
Acontece que o sistema de Lira acabou deixando uma parte dos deputados de fora da divisão. E agora eles estão se digladiando com os líderes de suas siglas para serem contemplados.
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À frente do PSL, Vitor Hugo criou seu próprio sistema de castas – repartindo as emendas de acordo com suas próprias prioridades e de alguns poucos e selecionados aliados, em vez de dividir o dinheiro de forma mais ou menos equânime no partido.
Vitor Hugo guardou R$ 100 milhões só para ele. Para parlamentares mais fiéis, como o delegado Marcelo Freitas (PSL-MG), ele reservou R$ 50 milhões. Os mais distantes receberam R$ 10 milhões.
E houve quem não levasse nada – Julian Lemos, que costuma ser fiel a Lira, mas tem diferenças com Vitor Hugo, foi um deles. Outro foi Júnior Bozella (PSL-SP), que costuma ser crítico a Jair Bolsonaro.
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E não foi só no PSL que a avidez de Vitor Hugo criou conflitos. Um dia antes da cobrança do deputado Julian Lemos, um deputado de outro partido, Glaustin da Fokus (PSC-GO) convocara uma reunião da bancada de Goiás para discutir um problema semelhante: Vitor Hugo estava enviando a prefeitos de sua região valores muito superiores ao que ele, Glaustin, era capaz de carimbar.
Segundo o relato de parlamentares goianos, Vitor Hugo estava enviando R$ 1 milhão para Corumbá de Goiás, cidade da base de Glaustin, enquanto o próprio Glaustin só conseguira uma cota de R$ 100 mil no orçamento secreto. A informação provocou apreensão na bancada de Goiás, uma vez que a disparidade em favor de Vitor Hugo poderia asfixiar as candidaturas de outros políticos no estado.
Ao ser procurado para falar do assunto, o deputado Glaustin da Fokus despistou: “Não teve nada a ver com emendas extras. A confusão foi porque ele procurou prefeitos e visitou cidades entrando em espaços que são não dele”, disse.
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Vitor Hugo não atendeu às nossas ligações, nem respondeu mensagens. A quem reclama da distribuição dos recursos, ele pede que enviasse uma lista de pedidos para avaliação. A briga, porém, acendeu um alerta no PSL.
Sem saber se podem mesmo confiar nas promessas de Vitor Hugo, um grupo de deputados agora pretende recorrer à “instância superior”. Levarão suas disputas ao próprio presidente da Câmara, para que ele as arbitre e encontre uma solução.
Por ironia do destino, para impedir que a revolta se alastre, talvez o poderoso Lira ainda tenha de modificar o próprio sistema de castas que criou.
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